segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Entrevista com o músico Alan Pear para Café com Siéllysson



Entrevista 18



Sua casa é um estúdio, seu ar tem sonoridade que cantarola durante um papo e outro, gestos quase teatrais, gargalhadas com ritmos musicais e um brilho nos olhos de quem é apaixonado, sua paixão tem um nome: música. Assim é o santarritense Alan Pear.

SIÉLLYSSON - Você já trabalha com música há muitos anos. Quando foi que você despertou para essa arte?
ALAN: - Creio que por volta dos meus 5 ou 6 anos de idade. Eu já desenvolvia umas melodias. Desde criança eu me descobri compositor. Acho um tanto fenomenal porque eu estou assim a toa, do nada as músicas surgem. Tem sido assim desde criança, eu pegava uma folha de papel dobrava no meio, e dos lados eu colava tornando-se um envelope. Noutro papel eu recortava em círculo e no meio eu desenhava o selo do vinil, fazia círculos dizendo que eram as faixas. Eu tinha pelo menos duas bandas imaginárias (Ele rir e se diverte com as lembranças) Eu colocava o disco na “vitrola” e como os rap´s eu fazia os instrumentos na boca e cantava ao mesmo tempo. Meus pais tiveram que conviver com este louco toda minha infância. (rimos juntos)

SIÉLLYSSON – Você teve uma banda Dolfhins de 2003 e lançaram um álbum em 2007. Os shows que vocês faziam eram com músicas de vocês ou de outros artistas?
ALAN: - Esta história começa antes de 2003. Reencontrei um amigo em meados dos anos de 1990, Robson Feoli, ele me disse que estava tocando violão, eu falei pra ele “cara, eu tenho umas composições”. Então a gente retornou nossa amizade e dela surgiu uma parceria na música. Ele ia lá em casa e cifrava as músicas.
Em 2003 ele me apresentou alguns programas de computadores para gravação. Tive em choque como todo mundo tem quando se depara com as novidades tecnológicas.
Ele queria produzir a música que abre o CD, Sobre botas, tudo partiu dali. Quando percebi que poderia materializar minhas músicas foi aí que surgiu o Dolphins. E nós passamos 3 anos enfurnados dentro de um quarto e gravamos o disco (Hi-tec lo-fi) nós mesmo bancamos o disco e conseguimos lançá-lo em setembro de 2007.

O Grupo Dolphins - Imagem do acervo pessoal de Alan Pear
SIÉLLYSSON – De onde vieram suas inspirações para compor o primeiro álbum (Hi-tec lo-fi)? Ele teve uma temática ou ele foi uma junção de várias músicas que não necessariamente teve que recorrer a um tema?
ALAN: - O disco não é conceitual, ele não é temático; como teve uma parceria com Robson Feoli, houve uma partilha que teve 10 faixas. Ele ficou com 3 faixas no disco porque na época ele tinha menos composições e eu fiquei com as outras 7, só que uma é instrumental. Minhas inspirações são as mais variadas. A faixa 1 e 3 do disco são mais autobiográficas mesmo, eu sou o meu objeto, minha essência está ali nessas duas músicas.

SIÉLLYSSON – Compor é algo fruto de uma inspiração, falo das letras suas, são sentimentos, emoções ou arte pela arte, vendo a métrica, melodia perfeita, vendo a rima correta?
ALAN: - As duas vertentes fazem parte do meu método de trabalho. Por incrível que pareça eu tenho método, (risos) mas como eu lhe falei as músicas me surgem assim involuntariamente. Outro processo que eu gostaria de falar é quando estou dormindo ou na etapa da transição do sono...  Vem...vem...vem com se cantassem no me ouvido, salto da cama pego meu gravadorzinho e balbucio qualquer coisa dentro daquela melodia, guardo e depois vem a parte propriamente metódica.
Primeiro, tem que ser noite, tem que ter bastante silêncio, tenho que me sentir bastante só, como se no mundo só existisse somente eu. Aí a letra vem, pode ser um sentimento, uma revolta, uma exaltação à natureza seja Biológica, humana, ecológica. Mas também faço algo mais exato. Sempre de uma forma ou de outra priorizo pela musicalidade das palavras, mas que a expressão delas me diga alguma coisa, não palavras por palavras.

SIÉLLYSSON – Você está na produção do seu primeiro CD solo denominado “Colmeia”, este álbum é temático?
ALAN: - Posso lhe dizer que ele é mais temático do que o Hi-tec lo-fi que é “Alta tecnologia para baixa fidelidade”. O tema está dizendo que a gente utilizava a alta tecnologia que tínhamos disponível na época, que hoje é absoleta, mas com poucos aparatos analógicos. Como você mesmo vê... (apontando para sua sala de gravações, um estúdio caseiro). Fugi um pouco da pergunta, né? (risos – volta pergunta)
Colmeia pode ser considerado um álbum temático mesmo assim não é um álbum conceitual. Não é um “The Wall.” do Pink Floyd.

SIÉLLYSSON – Mas você estudou, pesquisou para compor este álbum Colmeia?
ALAN: - Eu to muito envolvido, não academicamente, mas estou envolvido com assuntos que têm permeado sobre internet, à rede como um todo e os acontecimentos atuais, transições planetárias que muitos tem se referido e à ciência tem corroborando com isso. Até se vê profecias apocalípticas de alguns. Então toda essa coisa cibernética da sociedade de consumo e de informação. Há uma ebulição de tudo isso, há uma superpopulação. Eu ando de coletivo e “Nossa! Como tem gente pra descer de um ônibus quando ele para, e uma quantidade maior de pessoas pra subir”. É impressionante a superpopulação e tudo isso tem mexido com muitos artistas no mundo, tenho sentido eles como se fossem meus irmãos e ando numa sintonia muito fina com eles, então “Colmeia” é um disco que está preocupado com o hoje, com o urgente, com as relações humanas, a frialdade nas relações, noutra faixa há uma música que trata da ganância por dinheiro.
“Colmeia” está próximo das teorias do Marc Halévy sobre a Era do Conhecimento e das teorias de Manuel Castells sobre a Sociedade em Rede, sobre virtualidades e afins. Colmeia está bem voltado pra essa visão.

Alan em pesquisa de campo sobre as colmeias
SIÉLLYSSON – Você hoje é um underground por que produz seu próprio CD, sua gravação, sua arte, que agora está se materializando num novo trabalho sem gravadora, sem patrocínio, sem grandes investimentos para isso, ou ser underground é um estilo seu?

ALAN: - Um Underground é diferente do Mainstream. Quem está no mainstream está no Faustão, está na Record, está na Fazenda, vendendo, aparecendo... Muitas vezes ofuscando muita gente talentosa, marginalizada.
A não ser que a Prefeitura de Santa Rita criasse um grande complexo de mídia como nós temos no sudeste do Brasil, até mesmo em Pernambuco. A não ser que fosse assim, aí a gente poderia criar um panteão de grandes nomes santarritenses, porque é muita gente talentosa nessa cidade.
Eu sou underground para padrões locais, veja bem, não é um estilo de música que as pessoas estejam consumindo. Não tá na boca do povo, não tá nas rádios, mas se fosse fora do Brasil a minha música que tem uma forte influência de bandas internacionais, bandas da Escócia, da Irlanda, da Inglaterra, da Suécia, do Reino Unido como um todo até mesmo da Islândia que me influencia e muito, como é o caso da “Sigur Ros” e de bandas norte-americanas. A música que sai de mim é brasileira porque canto em português mas canaliza muitas dessas influências.

SIÉLLYSSON - Mas você já cantou em inglês.
Já sim, em shows como cover, mas como composição não. Lá fora eu não seria tão underground, porque eu seria visto como um psicodélico, um pop-rock, alternativo algo assim.

SIÉLLYSSON – O seu trabalho tem a inspiração também da banda “Grant Lee Buffalo”. Como você conheceu essa banda e qual a importância dela em seu trabalho?
Fundamental. Essa banda acabou em 1998, mas eu vim conhecer o trabalho dela em 2003. Senti a mesma emoção quando me deparei com a teoria sociológica de Louis Althusser sobre a interpelação, eu tive um estremecimento. Eu disse: “Isso é muito doido, cara.” O mesmo fenômeno eu senti quando estava na loja Música Urbana o dono (Robério) estava ouvindo e tocou a música “Arousing Thunder”.  Eu olhei pra o nada e me estremeci e disse “O que é isso, cara?” Costumo dizer que Grant Lee Buffalo não é uma banda é um acontecimento. Representa muito pra mim.

SIÉLLYSSON – Que mensagem você deixa para quem deseja ser compositor, músico e está lendo esta matéria?
Eu sou aquele que acredita que a música tem que vir acompanhada de informação. Nós não vivemos no século XVIII ou XIX, onde as músicas eram ou tribais ou era a música dita clássica europeia onde as notas falavam por si só. A música que se propõe rock... Eu entendo como uma linguagem e se não há um elemento transformador, pra mim não há rock, o cara pode ser roqueiro, ter o cabelo mais “espirritado” que for, mas se não há elemento questionador não há rock, se não há informação não é rock, temos que cutucar o que está errado.
Alan no lançamento do livro Crônicas com Siéllysson


Imagem acima: Alan Pear e Siéllysson (08 de julho de 2012) 
Entrevista publicada em 07 julho 2012 às 21:35

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