Entrevista
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Sua casa é um estúdio, seu ar tem sonoridade
que cantarola durante um papo e outro, gestos quase teatrais, gargalhadas com
ritmos musicais e um brilho nos olhos de quem é apaixonado, sua paixão tem um
nome: música. Assim é o santarritense Alan Pear.
SIÉLLYSSON - Você já trabalha com música
há muitos anos. Quando foi que você despertou para essa arte?
ALAN: - Creio que por volta dos meus 5 ou 6 anos
de idade. Eu já desenvolvia umas melodias. Desde criança eu me descobri
compositor. Acho um tanto fenomenal porque eu estou assim a toa, do nada as
músicas surgem. Tem sido assim desde criança, eu pegava uma folha de papel
dobrava no meio, e dos lados eu colava tornando-se um envelope. Noutro papel eu
recortava em círculo e no meio eu desenhava o selo do vinil, fazia círculos
dizendo que eram as faixas. Eu tinha pelo menos duas bandas imaginárias (Ele
rir e se diverte com as lembranças) Eu colocava o disco na “vitrola” e
como os rap´s eu fazia os instrumentos na boca e cantava ao mesmo
tempo. Meus pais tiveram que conviver com este louco toda minha infância. (rimos
juntos)
SIÉLLYSSON – Você teve uma banda Dolfhins
de 2003 e lançaram um álbum em 2007. Os shows que vocês faziam eram com músicas
de vocês ou de outros artistas?
ALAN: - Esta história começa antes de 2003.
Reencontrei um amigo em meados dos anos de 1990, Robson Feoli, ele me disse que
estava tocando violão, eu falei pra ele “cara, eu tenho umas composições”.
Então a gente retornou nossa amizade e dela surgiu uma parceria na música. Ele
ia lá em casa e cifrava as músicas.
Em 2003 ele me apresentou alguns programas de
computadores para gravação. Tive em choque como todo mundo tem quando se depara
com as novidades tecnológicas.
Ele queria produzir a música que abre o CD, Sobre
botas, tudo partiu dali. Quando percebi que poderia materializar
minhas músicas foi aí que surgiu o Dolphins. E nós passamos 3
anos enfurnados dentro de um quarto e gravamos o disco (Hi-tec lo-fi) nós mesmo
bancamos o disco e conseguimos lançá-lo em setembro de 2007.
O Grupo Dolphins - Imagem do acervo pessoal de Alan Pear |
SIÉLLYSSON – De onde vieram suas
inspirações para compor o primeiro álbum (Hi-tec lo-fi)? Ele teve uma temática
ou ele foi uma junção de várias músicas que não necessariamente teve que
recorrer a um tema?
ALAN: - O disco não é conceitual, ele não é
temático; como teve uma parceria com Robson Feoli, houve uma partilha que teve
10 faixas. Ele ficou com 3 faixas no disco porque na época ele tinha menos
composições e eu fiquei com as outras 7, só que uma é instrumental. Minhas
inspirações são as mais variadas. A faixa 1 e 3 do disco são mais
autobiográficas mesmo, eu sou o meu objeto, minha essência está ali nessas duas
músicas.
SIÉLLYSSON – Compor é algo fruto de uma
inspiração, falo das letras suas, são sentimentos, emoções ou arte pela arte,
vendo a métrica, melodia perfeita, vendo a rima correta?
ALAN: - As duas vertentes fazem parte do meu
método de trabalho. Por incrível que pareça eu tenho método, (risos) mas como
eu lhe falei as músicas me surgem assim involuntariamente. Outro processo que
eu gostaria de falar é quando estou dormindo ou na etapa da transição do
sono... Vem...vem...vem com se cantassem no me ouvido, salto da cama pego
meu gravadorzinho e balbucio qualquer coisa dentro daquela melodia, guardo e
depois vem a parte propriamente metódica.
Primeiro, tem que ser noite, tem que ter bastante
silêncio, tenho que me sentir bastante só, como se no mundo só existisse
somente eu. Aí a letra vem, pode ser um sentimento, uma revolta, uma exaltação
à natureza seja Biológica, humana, ecológica. Mas também faço algo mais exato.
Sempre de uma forma ou de outra priorizo pela musicalidade das palavras, mas
que a expressão delas me diga alguma coisa, não palavras por palavras.
SIÉLLYSSON – Você está na produção do seu
primeiro CD solo denominado “Colmeia”, este álbum é temático?
ALAN: - Posso lhe dizer que ele é mais temático
do que o Hi-tec lo-fi que é “Alta tecnologia para baixa
fidelidade”. O tema está dizendo que a gente utilizava a alta tecnologia que
tínhamos disponível na época, que hoje é absoleta, mas com poucos aparatos
analógicos. Como você mesmo vê... (apontando para sua sala de gravações, um
estúdio caseiro). Fugi um pouco da pergunta, né? (risos – volta
pergunta)
Colmeia pode ser considerado um álbum temático
mesmo assim não é um álbum conceitual. Não é um “The Wall.” do Pink
Floyd.
SIÉLLYSSON – Mas você estudou, pesquisou
para compor este álbum Colmeia?
ALAN: - Eu to muito envolvido, não
academicamente, mas estou envolvido com assuntos que têm permeado sobre
internet, à rede como um todo e os acontecimentos atuais, transições
planetárias que muitos tem se referido e à ciência tem corroborando com isso.
Até se vê profecias apocalípticas de alguns. Então toda essa coisa cibernética
da sociedade de consumo e de informação. Há uma ebulição de tudo isso, há uma
superpopulação. Eu ando de coletivo e “Nossa! Como tem gente pra descer de um
ônibus quando ele para, e uma quantidade maior de pessoas pra subir”. É
impressionante a superpopulação e tudo isso tem mexido com muitos artistas no
mundo, tenho sentido eles como se fossem meus irmãos e ando numa sintonia muito
fina com eles, então “Colmeia” é um disco que está preocupado com o hoje, com o
urgente, com as relações humanas, a frialdade nas relações, noutra faixa há uma
música que trata da ganância por dinheiro.
“Colmeia” está próximo das teorias do Marc
Halévy sobre a Era do Conhecimento e das teorias de Manuel
Castells sobre a Sociedade em Rede, sobre virtualidades e afins.
Colmeia está bem voltado pra essa visão.
Alan em pesquisa de campo sobre as colmeias |
SIÉLLYSSON – Você hoje é um underground
por que produz seu próprio CD, sua gravação, sua arte, que agora está se
materializando num novo trabalho sem gravadora, sem patrocínio, sem grandes
investimentos para isso, ou ser underground é
um estilo seu?
ALAN: - Um Underground é diferente do Mainstream.
Quem está no mainstream está no Faustão, está na Record, está na
Fazenda, vendendo, aparecendo... Muitas vezes ofuscando muita gente talentosa,
marginalizada.
A não ser que a Prefeitura de Santa Rita
criasse um grande complexo de mídia como nós temos no sudeste do Brasil,
até mesmo em Pernambuco. A não ser que fosse assim, aí a gente poderia criar um
panteão de grandes nomes santarritenses, porque é muita gente talentosa nessa
cidade.
Eu sou underground para padrões locais,
veja bem, não é um estilo de música que as pessoas estejam consumindo. Não tá
na boca do povo, não tá nas rádios, mas se fosse fora do Brasil a minha música
que tem uma forte influência de bandas internacionais, bandas da Escócia, da
Irlanda, da Inglaterra, da Suécia, do Reino Unido como um todo até mesmo da
Islândia que me influencia e muito, como é o caso da “Sigur Ros” e de
bandas norte-americanas. A música que sai de mim é brasileira porque canto em
português mas canaliza muitas dessas influências.
SIÉLLYSSON - Mas você já cantou em
inglês.
Já sim, em shows como cover, mas como
composição não. Lá fora eu não seria tão underground, porque eu seria
visto como um psicodélico, um pop-rock, alternativo algo assim.
SIÉLLYSSON – O seu trabalho tem a
inspiração também da banda “Grant Lee Buffalo”.
Como você conheceu essa banda e qual a importância dela em seu trabalho?
Fundamental. Essa banda acabou em 1998, mas eu
vim conhecer o trabalho dela em 2003. Senti a mesma emoção quando me deparei
com a teoria sociológica de Louis Althusser sobre a interpelação, eu tive um
estremecimento. Eu disse: “Isso é muito doido, cara.” O mesmo fenômeno
eu senti quando estava na loja Música Urbana o dono (Robério)
estava ouvindo e tocou a música “Arousing Thunder”. Eu olhei pra o nada e
me estremeci e disse “O que é isso, cara?” Costumo dizer que Grant
Lee Buffalo não é uma banda é um acontecimento. Representa muito pra
mim.
SIÉLLYSSON – Que mensagem você deixa para
quem deseja ser compositor, músico e está lendo esta matéria?
Eu sou aquele que acredita que a música tem que
vir acompanhada de informação. Nós não vivemos no século XVIII ou XIX, onde as
músicas eram ou tribais ou era a música dita clássica europeia onde as notas
falavam por si só. A música que se propõe rock... Eu entendo como uma linguagem
e se não há um elemento transformador, pra mim não há rock, o cara pode ser
roqueiro, ter o cabelo mais “espirritado” que for, mas se não há elemento
questionador não há rock, se não há informação não é rock, temos que cutucar o
que está errado.
Alan no lançamento do livro Crônicas com Siéllysson |
Imagem acima: Alan Pear e Siéllysson (08 de julho de
2012)
Entrevista publicada em 07 julho 2012 às 21:35
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